13/09/2016

POSSE DO ACADÊMICO MÁRIO LIMA BRASIL NA ACADEMIA ACREANA DE LETRAS - AAL




Discurso de Posse do Acadêmico Prof. Dr. Mário Lima Brasil - ACADEMIA ACREANA DE LETRAS, quarta-feira, 27 de julho de 2016

Saúdo nossa Presidente a confrade Luísa Galvão Lessa Karlberg, autoridades presentes, meus amigos e minhas amigas.

Ainda na Presidência do confrade Clodomir Monteiro, a quem presto minhas homenagens, e no ano que conclui e apresentei a composição de minha autoria, Espetáculo Interativo Chico Mendes, fui eleito, com muito orgulho, para ocupar a cadeira nº 15 da Academia Acreana de Letras. Cadeira que tem como patrono Belarmino de Mendonça Lobo e como antecessor Jorge Kalume. Aqui me reportarei aos escritos de Leandro Tocantins nosso escritor e poeta e do pesquisador do exército Hiram Reis e Silva Coronel da Reserva da Arma de Engenharia, também pesquisador do Departamento de Ensino e Cultura do Exército Brasileiro para buscar as memórias do nosso patrono e antecessor.
 A parteira se apressava e a criança estava a nascer, ninguém sabe ao certo o nome que seria dado. Os índios da região, abundantes naquela época, o chamavam de Aquiry. Os convidados da História, sem se conhecerem, seguiam o curso do rio. O primeiro barco que subia o rio trazia os nordestinos, ávidos para participar do batizado daquela linda criança no extremo oeste da Amazônia e nele vinha a família Lima, do meu avô Júlio. Outro barco se apressava para o nascimento daquela criança-estado, e trazia consigo os sírio-libaneses, dentre eles a família Kalume, que carregava nele o comercio dos regatões. Mais atrás, o terceiro barco trazia expedições, agrimensores, como a que trouxe o General Belarmino de Mendonça Lobo, ia fazer estudos nas terras do Juruá e vinha de terras distantes, convidado pela história para fazer parte daquele batizado de um Estado. A uma distância de apito, vinha o navio de guerra para a oficialização da deposição das armas dos revolucionários acreanos, nele vinha o meu avô Tenente Aderbal Brasil. Quatro barcos e um único destino. Como um rio que é formado de pequenos rios que são formados de pequenos Igarapés, assim também tece a história os seus pequenos encontros.  A história convidou esses quatro barcos para testemunharem o nascimento de uma criança-estado.  Sem saber adentraram cada um deles por essa porta da história e desaguaram dentro desta sala da Assembleia Legislativa do Acre. Se um desses barcos tivesse naufragado e não chegado até aqui a história seria outra e talvez não tivesse eu recebendo humildemente as homenagens dessa Augusta Academia.
 Meu Patrono, Belarmino de Mendonça Lobo, adentrou as portas da história do Acre como chefe da “Comissão Brasileira de Reconhecimento do Alto Juruá”, em 1904. Na mesma época chegou meu avô, Tenente Aderbal Brasil, cuja primeira missão foi guardar o barracão onde os revolucionários depuseram suas armas. Logo depois ele se dirige também ao Juruá, Tarauacá, e lá nasce meu pai, Geraldo Brasil, que em 1937 regressa de Belo Horizonte para fundar, junto com outros da sua geração, o primeiro sodalício da Academia Acreana de Letras (acredito o único confrade, na cadeira 7, da época da fundação, ainda entre nós). Aqui estou eu, na cadeira no. 15, com muito orgulho. Não estaria aqui se não fosse o encontro de todos esses barcos e o meu patrono General Belarmino de Mendonça Lobo, pois seu trabalho e o de Euclides da Cunha, deram a certeza à Barão de Rio Branco que a decisão certa havia sido tomada e podia o Brasil, tranquilamente, embalar esse estado-criança no berço da história.
O General Belarmino Augusto de Mendonça Lobo nasceu em 1850, na antiga Província do Rio de Janeiro, filho de Belchior de Mendonça Lobo. Assentou praça, a 4 de março de 1865, no 5° Corpo de Voluntários da Pátria, seguindo para os campos de Guerra paraguaios, onde participa nos combates dos Fortes Curuzu e Curupaiti, e na Batalha de Tuiuti (todos em 1867), sendo elogiado por seu comportamento nas ações militares. Participa, também, das Batalhas de Itororó e de Avaí, o que lhe valeu a promoção de Alferes, por atos de bravura. Em Lomas Valentinas foi gravemente ferido e hospitalizado. Recebe, então, elogio do Ministro da Guerra em nome do Imperador Dom Pedro II.
Após a missão no Juruá, o relatório do General Belarmino e Mendonça Lobo permaneceu escondido da história por oito décadas, redescoberto pelo nosso escritor Leandro Tocantins na década de 80, foi pelo mesmo, sugerida a publicação com o título ´"Reconhecimento do Rio Juruá".
 Porém, a história senhoras e senhores, tem seus cursos sinuosos e vai me ligar de forma sutil ao meu antecessor. Meu avô Júlio, residente em Xapuri da família Lima, que veio no barco que trouxe os nordestinos, me ligará diretamente ao meu antecessor e confrade Jorge Kalume, que veio no barco dos sírio-libaneses. Na terra de Chico Mendes se misturarão as famílias, Kalume, Eluan, Lima e Brasil, a qual pertenço, e o rio da história, me levará, no seu curso, a desaguar da cadeira no. 15, antes pertencente ao ilustre confrade que passo a prestar minhas homenagens.
 Jorge Kalume, antecessor da cadeira no.15, muita nos orgulha. Nascido em 3 de dezembro de 1920, em Belém do Pará, era filho de Abib Moisés Kalume e de Latife Zaire Kalume. Sua trajetória liga-se as origens da ocupação das terras do Alto Acre, e dos migrantes sírio-libaneses que chegaram aqui na virada do século XIX, para o XX.
 Graduou-se em administração de empresas, foi comerciante em Xapuri, no Acre, e passou a ser conhecido na cidade. Atuou na Associação Comercial de Xapuri e foi eleito Prefeito da cidade. Jorge Kalume também foi Deputado Federal, Governador do Acre, prefeito de Rio Branco e Senador.
 No parlamento apresentou vários projetos, dentre eles, o que cria o Dia da Cultura, aprovado em 1970, instituindo o dia 05 de novembro para sua comemoração, em homenagem ao aniversário de Rui Barbosa; e o que cria o Dia da Amazônia, comemorado no dia 5 de setembro.
 Escritor renomado, é autor de “templo Inesquecível”, “Crônicas do Acre Antigo” e “Dos Seringais Acreanos ao Congresso Nacional”. Pertence ao Clube dos Pioneiros (da qual já foi Presidente), a Academia Brasileira de Letras de Brasília e ao Instituto Histórico e Geográfico de Brasília, além de ser Rotariano. Possui várias medalhas do Exército, da Aeronáutica e outras de reconhecimento.
 Senhoras e senhores:
Ao contemplar o sodalício dessa Augusta Academia, a quem mais uma vez presto minhas homenagens, penso que se deva a um lampejo de coragem e do incentivo de amigos e amigas como Clara Bader, minha ousadia de levar até o fim a minha candidatura. O fiz também para honrar o nome do meu pai, um dos fundadores dessa Academia. Nem de longe meus modestos trabalhos podem se comparar aos dos confrades que aqui estão, verdadeiros arautos das letras acreanas.
Possuo trabalhos modestos, quase todos eles de música. Em três deles, que gostaria de citar aqui, ousei enveredar pelo caminho da literatura e junto com a parte da orquestra compus os libretos e as poesias. São eles: "Amazônia, o último sonho", um balé para Butoh, dança-teatro japonesa e recitante, inédita no Brasil, teve sua estreia no Japão em 1992; minha ópera "Aquiry, a luta e um povo", sobre a Revolução Acreana, teve sua estreia em 2004 aqui no Teatro Plácido de Castro e finalmente meu último trabalho, composto em parceria com Airan de Sousa, o "Espetáculo Interativo Chico Mendes", apresentado como espetáculo híbrido na SBPC de 2014 na UFAC.
O primeiro trabalho é composto de 30 cenas e em cada uma delas pelo menos dois poemas acompanham cada cena. Na segunda, Aquiry, é composta de 29 cenas e também pelo menos 2 poemas em cada cena. A última é composta de 25 cenas, com dois poemas em casa cena.
 Senhora Presidente, nosso Estado formou-se das idas e vindas desses barcos, hoje continuam indo e vindo, mas não mais pelo rio, os barcos hoje correm pelo asfalto e voam pelos ares. Hoje não são só os nordestinos que chegam, mas paulistas, gaúchos, mineiros e tantos outros de vários estados. Não somente os sírio-libaneses, mas povos de vários lugares do mundo são atraídos pela nossa fauna, flora e cultura. Eu fui um dos que parti, sai do Acre, mas o Acre não saiu de mim. Está impregnado na minha maneira de ser, nas minhas obras e no meu pensamento.
Para concluir senhora Presidente, gostaria de recitar um pequeno trecho da minha Ópera Aquiry, a Luta de um Povo, em homenagem aos bravos seringueiros da nossa terra.

Canto do Seringueiro - Aquiry, a Luta de um Povo

To chegando com coragem
Esperança na bagagem
De ganhar dinheiro logo
E voltar
Pro patrão já devo antes
De comprar, devo o bastante...
Trabalhar a vida inteira
E não pagar
Raspadeira e cabrita
Lâmina, balde e tubiba
Tijelinha e sarrapilha
A transbordar
Espingarda e poronga
Sal e fumo e bornal
Tudo faz a minha dívida aumentar.
Ah! Como vou voltar
Pro meu Ceará
Isto eu não sei
Ah! Mas quando eu voltar
Que eu volte como
Se fosse um rei
II
Quatro horas, madrugada.
Galo canta no roçado
A mulher já está acordada
A trabalhar
Seringueiro se prepara
Espingarda não esquece
O café que lhe aquece
Quando há
Depois disso pé na estrada
Seringueira é sua amada
Que o cabresto afiado
Faz chorar
Leite, seiva dessa vida.
Vai jorrando da ferida
Saco cheio, já é hora.
De voltar
Ah! Como vou voltar
Pro meu Ceará
Isto eu não sei
Ah! Mas quando eu voltar
Que eu volte como
Se fosse um rei
III
Cavalete aprumado
No mourão já bem fincado
Cavador começa agora
A rodar
Derramando com cuidado
Leite e seiva dessa vida
Construindo a péla viva
A defumar
Desce o rio se aprumando
Na borracha que boiando
Vai levando a sua vida
Ao barracão
Vende tudo num instante
Compra mais lá adiante
Tudo faz a sua dívida
Aumentar
Ah! Como vou voltar
Pro meu Ceará
Isto eu não sei
Ah! Mas quando eu voltar
Que eu volte como
Se fosse um rei

A maioria jamais retornou, criaram raízes nessas terras e nós somos os frutos dessa odisseia acreana. Muito obrigado!


12/09/2016

DISCURSO DE POSSE DO ACADÊMICO Prof. Dr. Alvaro Sobralino de Albuquerque Neto, cadeira nº 31 - AAL, em 15 de junho de 2004, e Discurso em homenagem ao Centenário de J.G. de Araújo Jorge, na cidade de Tarauacá, ano 2014- Acre




Prof. Dr. Álvaro Sobralino de Albuquerque Neto (dois importantes Discursos)



ACADEMIA ACREANA DE LETRAS
MEMORIAL DOS AUTONOMISTAS
THEATRO HÉLIO MELO


DISCURSO DE POSSE NA CADEIRA Nº 31
ACADÊMICO PROF. DR. ALVARO SOBRALINO DE ALBUQUERQUE NETO


Presidente da Academia Acreana de Letras, Prof. Dr. Clodomir Monteiro
Demais autoridades, convidados e familiares presentes.

Ao tomar posse da Cadeira nº 31 da  Academia Acreana de Letras, sinto-me honrado e agradecido da votação obtida de parte dos imortais desta Academia.
Se a lisonja é grande, imensa é a responsabilidade que agora assumo, “De tudo fazer para o engrandecimento desta Entidade”.
A Cadeira nº 31 tem como Patrono o Poeta Juvenal Antunes, e como Fundador o Professor Joaquim Rufino Soares. Meu antecessor foi o Jornalista José Chalub Leite, o conhecido Zé Leite.
Juvenal Antunes (O Patrono) e “Zé Leite” (O Antecessor) têm algo em comum. Ambos morreram jovens, aos 58 anos, em plena produção intelectual. Donos de humor satírico e críticos mordazes dos aduladores. O desapego material também era uma identidade comum aos homenageados aos quais dedico as seguintes palavras.

JUVENAL ANTUNES (1883/1941)
Poeta Potiguar admirável, intelectual de humor ferino, “andarilho” e boêmio por opção. Tido como o “rei da pornografia”, só produzia intelectualmente quando embriagado.
Autor de “elogio da preguiça”, nasceu em Ceará-Mirim (RN),em 1883 e faleceu em Manaus (AM) em 1941, quando retornava para Natal (RN).
Juvenal Antunes foi um intelectual que encheu de brilho o Velho Acre e promovia bacanais homéricos no Hotel Madrid, onde residia, no 2º Distrito.
Cético e Materialista, descrevia sua última viagem assim: “Quando eu morrer, não quero ir para o Céu. Jamais suportaria o ambiente chato do Céu, com São Pedro fazendo rabugices e onze mil virgens entoando cânticos sacros. Jamais! ... Quando morrer, quero ir para o inferno! Isto sim! Ali encontrarei todas as almas devassas, todas as pecadoras, todas as mulheres perdidas, todas as prostitutas do mundo. E aí é que vou gozar de verdade!”.

JOSÉ CHALUB LEITE (1939/1998)
José Chalub Leite era o filho primogênito do casal Miguel de Freitas Leite e Maria Chalub Leite. Pai de Tereza Cristina, Aryzinho e Artur César, “riquezas eternas do meu existir”.
Nascido em Rio Branco (AC), em 13-12-1939, faleceu aos 58 anos (29-03-1998), fulminado por um infarto agudo do miocárdio.
O também jornalista Antonio Stélio, no prefácio do livro “Tão Acre’ (1992), descreve Zé Leite como “Um acreano entronizado no gurinismo de nosso jornalismo amazônico, maroto, cabloco” e que quando escrevia, produzia “textos elaborados como um escultor esculpe a madeira”.
Dedicado aos “causos” de nossa gente, Zé Leite se enquadra no que muitos escritores denominam de Realismo Fantástico, “porque fantástico são os fatos. Fantástica é a realidade. Afinal, o fantástico está aqui”.
Zé Leite dizia que “se não fosse jornalista, queria ser jornalista”. Esta era a sua vocação irremediável que teve início na década de 60, num seminário estudantil. Ele dizia “o jornalismo me realizou, mas não me enricou. Também para quê? Quando morrer não quero nada que não caiba no meu caixão”.
Na atividade jornalística, Zé Leite fundou vários semanários, como: O Estudante, Folha Estudantil, A Vanguarda, Jornal do Acre, A Gazeta, O Imparcial, A Bola e A Bola em Revista. Colaborou com os jornais Tribuna do Povo, O Estado do Acre e O Estado. Criou O Chute (4 números). Editou o semanário O Jornal. Foi editor de esportes, diretor geral e editor do jornal O Rio Branco. Durante alguns anos foi correspondente da Revista do Esporte (Manaus), Veja, Placar, O Globo, O Cruzeiro. Fundou a Associação dos Cronistas Esportivos do Acre e a Federação Acreana de Pugilismo.
Foram mais de três décadas de jornalismo “de muito chão, lotadas de alegrias e decepções, mil ilusões perdidas, com direito à percepção de reconhecer os verdadeiros amigos e a certeza de ter, no dia-a-dia das redações, ter ajudado a escrever a história acreana”.
Sobre sua obra Tão Acre, escrita em 1992, Zé Leite afirmava ser um “Jamaxi de gargalhadas, varadouro de humor, jirau de “causos”, poronga de folclore, sapupema de alegria, cuia-pitinga de gaiatice, piracema de verve, varadouro de chiste, repiquete do jocoso, banzeiro do picaresco, tapiri de semiologia, açude do riso antológico acreano na bubuia satírica, espirituosa e histriônica que sabe demais ao coração e gostosamente à alma de nossa gente sofrida e largada nos confins do extremo oeste do Brasil”. Nesta obra, Zé Leite afirma que “o que não acontece no Acre, não acontece em lugar algum do Brasil: cambista de bicheiro faz greve; médico em Sena Madureira atesta gravidez de homem de 70 anos; motorista de táxi dá carona; prefeito inaugura quebra-molas com banda de música e foguetório; prostituta tem orgasmo múltiplo... e dá de graça; Reitor da UFAC manda abrir inquérito para descobrir quem fez cocô na piscina; Preso escapa do presídio serrando barra de ferro com gilete; “mucura de dois pés” come, numa noite, 1.666 galinhas do governo...e fica por isso mesmo”.    

Muito obrigado.
Rio Branco, Acre em 15 de junho de 2004.
42 anos de Emancipação do Estado do Acre



“Salve J. G. de Araújo Jorge”.

Prof. Dr. Alvaro Sobralino de Albuquerque Neto.
(Cadeira Nº. 31 da AAL)

          Festejamos nesta data o centenário de José Guilherme de Araújo Jorge, nascido no dia 20 de maio de 1914, na antiga Vila Seabra, atual município de Tarauacá. Conhecido no Brasil e no exterior como J. G. de Araújo Jorge, iniciou sua formação escolar em Rio Branco, capital do Estado do Acre, continuando no Rio de Janeiro, onde concluiu sua graduação em Direito na antiga Universidade do Brasil, atual UFRJ. Prosseguiu seus estudos em Coimbra, ocasião em que lhe foi outorgado o título de “estudante honorário” e em Berlim, na Alemanha, onde concluiu um curso de Extensão Cultural.
          J. G. de Araújo Jorge ficou conhecido como o “Poeta do povo e da mocidade”, pela sua mensagem social e política e por sua obra lírica, de linguagem simples, impregnada de romantismo moderno, mas às vezes dramático.
          Eleito Deputado Federal pelo MDB (atual PMDB), no Rio de Janeiro, exerceu suas atividades parlamentares de 1970 a 1978. Homem de múltiplas atividades foi compositor, jornalista, publicitário, locutor, redator de programas radiofônicos, professor de História e de Literatura no colégio D. Pedro II. Também compôs lindas canções, das quais se destacam: “Confessando que te adoro” e “Meu amigo violão”, ambas interpretadas por Silvio Caldas e “Indiferença”, gravada na voz de Carlos Galhardo.
          Seu primeiro poema, intitulado “Ri, palhaço”, foi publicado no jornal Correio da Manhã (1931), quando o autor tinha somente 17 anos de idade. Daí em diante publicou dezenas de obras, inicialmente líricas, destinadas aos corações enamorados. J. G. fala à alma de toda gente porque traduz seus desejos, angústias e esperanças.
          Com a publicação de “Canto da Terra” (1945), a poesia jorgeana chega a ser situada no plano de Castro Alves. Desta obra destaca-se o poema intitulado “Vergonha” como um dos mais belos da coletânea.
          De acordo com o jornal O Globo, a publicação de “Estrela da Terra” (1947), eleva J. G. de Araújo Jorge à categoria de um Neruda. No mesmo sentido o romeno Stefan Baciu afirmou na ocasião que “É hoje comum, em certos círculos literários da Europa, falar-se do poeta chileno Pablo Neruda. De idêntico valor, como intérprete do ardente coração sul-americano, da pobreza de sua gente, do sentimento humano e da beleza deste continente, é J. G. de Araújo Jorge. Estrela da Terra é, sem dúvida, um dos mais belos e fortes poemas, traduzido para vários idiomas”. Desta coletânea, “Monólogo” se destaca por sua contemporaneidade.

“MONÓLOGO”
Meu filho,
Se te dissesse que poderia haver um mundo de duas classes.
Em que uns trabalham e outros não,
E os que trabalham, mendigam, passam fome,
E os inúteis gozam e desperdiçam,
Se te dissesse que poderia haver um mundo em que uns têm tudo: pão, remédio, crianças, futuro.
-Já nasceram proprietários do futuro!
E os outros não têm nada,
Nem mesmo os meios para a luta,
A grande luta desigual.

Se te dissesse que nesse mundo há homens de automóveis, tapetes, mulheres perfumadas,
E homens na chuva, ao relento e mulheres nas calçadas,
E aos primeiros não causa a menor impressão tal acontecimento,
E os outros não se revoltam – estendem apenas a mão vazia
E exalam lamúrias.

Se te dissesse que a justiça e a fé são mercadorias inacessíveis aos realmente necessitados:
E o Direito é apenas a lei que manterá tal estado de coisas:
E há homens que jogam a riqueza pelo prazer de jogar
E outros que a mereciam e morrem sem conquistá-la.

E se te dissesse que apesar de tudo, esse mundo existe realmente,
E vive, e progride, e avança, havias de me dizer: impossível, meu pai,
Um tal mundo jamais poderia existir nem poderia a vida afinal, ser tão má!
Entretanto, meu filho, basta abrires teus olhos.
Aí está – parece incrível, não é? – mas aí está.  

          Em “A outra face” (1949), há uma transformação na poética jorgeana que passa a manejar o verso com maior liberdade rítmica, e com uma tendência subjetiva, evitando o parnasiano descritivo. Romântico e socialista, é o poeta moderno que interpreta seu tempo e vê sua mensagem cumprir sua missão.
          Em 1986, onze meses antes de seu falecimento, J. G. de Araújo Jorge publicou sua última obra, intitulada “Tempo será”, na qual consta o poema “Finados”.

“FINADOS”
Mãe, hoje é dia de finados.
Não, não é remorso.
 Neste momento leio nos jornais que milhares de criaturas se atropelam nos cemitérios levando flores a seus mortos.

Não vou lá, mãe. Não gosto de cemitério.
Lá não sei te encontrar, nem me sinto em paz, perdido entre multidões...
E sofro de imaginar-te imóvel, prisioneira num gavetão de concreto empilhado num muro branco, de lamentações...

Não, mãe, não me sinto em paz,
Nem adianta procurar-te em meio a tanta gente estranha,
Misturar tua imagem tão viva quando te penso viva,
Com a lembrança da morte que deforma e desfigura
E com lutos e flores convencionais.

Ah, depois que partiste, não gosto de pensar onde te encontras,
Em minha aflição, hás de ter a certeza de que todo dia
É dia de finados em meu coração.

          Finalizando, reafirmo o que já foi dito sobre  J. G. de Araújo Jorge, O tempo ‘secou’ sua pena, calou sua voz, mas seu legado de amor, fé e perseverança, ficará para sempre entre nós.

Muito Obrigado.
Tarauacá – Acre, Maio de 2014.