08/09/2016

DISCURSO DA PRESIDENTE DA AAL POR OCASIÃO DA POSSE DO ACADÊMICO MÁRIO LIMA BRASIL



Ilustres autoridades presentes ou representadas, os cordiais cumprimentos do sodalício da AAL neste lindo dia em que a Academia Acreana de Letras recompõe, em parte, o seu sodalício, com a chegada de um laureado acadêmico.
Assim, é com júbilo e emoção que esta Augusta Academia Acreana de Letras acolhe, hoje, em seu quadro de imortais, o Prof. Dr. MÁRIO LIMA BRASIL. Sapientia Aedificavit Sibi Domum. A sabedoria edificou para si uma casa.
Tem sido através do mundo da cultura, no aprendizado e no aprimoramento dos vários conhecimentos existentes no orbe, seja nas ciências exatas, humanas, sociais, da saúde,  dentre outras, que o ser humano tem alcançado patamares desenvolvimentistas capazes de proporcionar o bem-estar social e melhoria da qualidade de vida para toda a humanidade.
E nesse contexto, as instituições acadêmicas têm sido, indubitavelmente, grandes difusoras e receptáculos dos conhecimentos, desde priscas eras, quando o mítico Platão fundou a primaz Academia em Atenas, na antiga Grécia, no ano 387 a. C., ocasião em que preconizava o desejo de “educar os jovens de maneira oposta à sofística, preparando-os para a união entre o poder político e a ciência, no engrandecimento humano”.
Mais tarde, na França, século XVII, foi criada a primeira academia de Letras, com objetivos definidos, o cultivo das letras, o prestígio à arte e, variavelmente, o reconhecimento aos valores das ciências. Suas normas e cláusulas são estabelecidas em estatuto devidamente legalizado. A Academia Acreana de Letras – AAL, seguindo os moldes daquela primeira criada na França, no século XVII, possui 40 cadeiras, então preenchidas por pessoas notabilizadas por algo expressivo de sua própria criação, tornando-se por esta razão, imortais, posto que ‘Letras’ possui status para se imortalizar.
E foi com esse mesmo objetivo que há 78 anos veio a lume a Academia Acreana de Letras, agregando, desde então, em suas hostes, profissionais literatos e cientistas, profissionais da área de Letras -- culto sagrado ao idioma pátrio e à literatura de expressão portuguesa -- e outras áreas afins, a promoverem a difusão e o desenvolvimento das ciências em geral. É como diz a frase latina – A sabedoria edificou para si uma casa.
Aqui somos mulheres e homens cultuadores das boas letras, da literatura, do humanismo e das ciências, sempre colimando por objetivo o culto às letras do idioma pátrio e à literatura de expressão portuguesa, com o olhar na higidez do idioma, indistintamente de classes sociais.
Destarte, é por tal razão que este sodalício hoje, aqui reunido, engalana-se, para a posse do novel Acadêmico MARIO LIMA BRASIL, cadeira nº 15, que tem por patrono  Belarmino de Mendonça ---  homem que sentou praça no Exército em 1865, quando partiu como soldado para a Guerra do Paraguai (1864-1870). Proclamada a República, em 15 de novembro de 1889 e convocadas às eleições para o Congresso Nacional Constituinte, em 15 de setembro de 1890, foi eleito deputado pelo Paraná. Tomou posse em 15 de novembro, participou da elaboração da Constituição promulgada em 24 de fevereiro de 1891 e, com o início, em maio, da legislatura ordinária, tomou assento na Câmara dos Deputados até dezembro de 1893. Com o término da legislatura, voltou à vida militar e foi promovido coronel em 1895.
Durante sua longa trajetória como militar, foi inspetor da 12ª Região Militar, fiscalizou o serviço de navegação dos rios Iguaçu e Negro e dirigiu a construção de ramais férreos e a exploração de rios. Foi também adido ao Ministério das Relações Exteriores e subchefe do Estado-Maior do Exército. Além disso, foi ministro do Superior Tribunal Militar. Faleceu no dia 28 de maio de 1913.
A cadeira nº 15 tem por antecessor JORGE KALUME -- Filho do imigrante Sírio Abib Moizés Kalume e de Latife Zaine Kalume. Estreou na política ao eleger-se prefeito de Xapuri, em 1955. Eleito deputado federal pelo PSD, em 1962, renunciou  para assumir o governo do Acre como mandatário ungido pelo Regime Militar de 1964. Eleito Senador da República pelo Acre, em 1978. Foi homem que dedicou a vida às causas acreanas, sempre com lisura e honradez.
Hoje, toma assento na mesma cadeira o Prof Dr. Mário Lima Brasil. O novel acadêmico é resoluto e perseverante em seus anelos, por isso espera-se que traga mais glória a esse honrado sodalício, posto possuir gênio indagativo, perscrutador e curioso,  fascinando-se e fascinando-nos, dentre tantos brios, por notas musicais e belas partituras...
Nosso ilustre acadêmico ostenta em seu “Curriculum”, trabalhos maravilhosos, outorgados por entidades nacionais e estrangeiras.
Seja bem-vindo ao nosso sodalício, Professor MARIO LIMA BRASI. Manifesto o regozijo que nos acomete neste ensejo de tê-lo doravante como nosso confrade, valendo-nos da oportunidade para estender cumprimentos aos Vossos familiares que não puderam estar aqui hoje.
Movida pelo enlevo natural que nos envolve em átimos como este, quando representantes de vários segmentos da comunidade regional, aqui vêm congregar-se conosco, prestigiando mais um evento da Academia Acreana de Letras, como um incentivo à cultura e ao desenvolvimento científico e intelectual da região acreana, lanço um olhar esperançoso no futuro do Brasil, hoje mergulhado em escândalos, o nosso Acre querido, que agrega nesse sodalício mulheres e homens que podem soerguer o nome do Acre e do Brasil, dando-lhe uma respeitável parcela de credibilidade junto ao concerto harmonioso e orquestrado por todas as nações.
Prof. Mario Lima Brasil, receba, aqui, de seus novos confrades, a mais calorosa acolhida, na certeza de que a sua presença  honra e dignifica esta Casa.

Senhoras e Senhores, muito obrigada pelo prestígio de tê-los aqui presentes.

MARAVILHOSA COLETÂNEA "Mundo dos textos". Vol.I Língua Portuguesa & Linguagem; Vol. II Educação & Comunicação; Vol. III Língua & Sociedade.Livros importantes no apoio aos professores e alunos quanto à leitura e interpretação de textos. Também modelos no aspecto estrutural e quanto ao gênero argumentativo. Será lançada na Bienal do Livro no mês de novembro. Haverá um pré-lançamento no Campus Floresta, por ocasião do Workshop de Língua Portuguesa & Dialectologia, em outubro próximo.




Para falar desta Coletânea "LEITURA PARA TODOS, Vol I, II, III, diz-se, inicialmente, ser de conhecimento irrefutável que a leitura e a escrita são pontes incontestáveis para que haja uma inclusão dos indivíduos dentro da sociedade. Tendo a escola a responsabilidade de sistematizar esses saberes, relembramos, aqui, não ser tarefa apenas do professor de língua portuguesa a utilização de textos suplementares, para que haja uma aquisição significativa da linguagem. Pois é a ausência da pouca compreensão da linguagem e a deficiência em leitura  a maior causa do fracasso escolar, em todas as disciplinas ou áreas de conhecimento.
E como a escola tem o compromisso e a responsabilidade de sistematizar esses saberes, salienta-se não ser papel apenas do professor de língua portuguesa, em utilizar-se de textos, para que haja, por parte dos estudantes, uma melhor e maior compreensão da linguagem. Para esse êxito, outras disciplinas do Ensino Fundamental devem lançar mão de textos que abordem temas da vida, dos mais variados gêneros disponíveis, no meio social, com um fim comum: a inserção do aluno no mundo letrado.
Com o pensamento nos professores e alunos, na busca de textos, reconhecendo, pois, a importância dessa tarefa escolar, em sala de aula, não podemos nos furtar de oferecer um número significativo de textos, com temáticas variadas, para atender os professores e  estudantes brasileiros. Que a utilização desses textos, em sala de aula, aconteça com mais frequência e que este uso possa articular-se, coerentemente, dentro de uma proposta interdisciplinar harmoniosa entre as áreas de conhecimento, nas escolas de ensino médio, fundamental e mesmo nas Universidades. Ler é uma tarefa boa para todas as pessoas, em todas as idades e em todos os tempos.
Segundo as orientações apresentadas pelos PCNs, todo professor, independente da sua área de formação, deve ter o texto como instrumento de trabalho. Este, por sua vez, deveria ocupar lugar de destaque no cotidiano escolar, pois, através do trabalho orientado para leitura, o aluno deveria conseguir apreender conceitos, apresentar informações novas, comparar pontos de vista, argumentar, etc. Dessa forma, o aluno poderá caminhar adiante na conquista de sua autonomia no processo de aprendizado. No entanto, o que se observa é que construir habilidades e competências que envolvam a leitura e a produção textual é papel atribuído apenas e tão somente aos professores de língua portuguesa, limitando o espaço do texto na escola. E esse espaço deve ser ampliado e muito.
Por isso ouvem-se muitas críticas sobre as práticas pedagógicas de língua materna. Afinal, muitas são as dificuldades dos alunos, no que diz respeito ao desenvolvimento da proficiência em leitura e compreensão de um texto. No entanto, não podemos esquecer que é papel da escola, como um todo, tornar nossos alunos capazes de utilizar a linguagem como instrumento de aprendizagem, sabendo fazer uso de informações contidas nos textos, bem como conhecer e analisar, criticamente, os usos da língua como veículo de valores e preconceitos de classe, credo, gênero ou etnia.
Foi com o pensamento voltado para esse cenário e, também, considerando que algumas instituições brasileiras demonstraram interesses sobre os meus textos, que resolvi reunir, parte deles neste livro. Também, considerei o fato de haver cedido parte desse material para o Estado de São Paulo, Secretaria de Estado de Educação e Cultura, para elaboração de livros didáticos de apoio aos professores do Ensino Médio e, ainda,  para a Organização Educacional Farias Brito, para elaborar material didático de revisão, contendo apenas questões sob o título de Resolva Enem I, que fará parte da coleção Anual Volume 2. A tiragem é de 10.000 cópias, também no Estado de São Paulo. E neste Volume V, intitulado LEITURA PARA TODOS, reuni parte dos artigos que escrevo nos Jornais: “A Gazeta do Acre” (Brasil, Acre), Agência Amazônia de Notícias (Brasil – DF) e Gosto de Ler (USA).
Conheço, de perto, as dificuldades que sentem os professores de Língua Portuguesa, especialmente, quando precisam de um texto de apoio para as aulas de gramática e mesmo de interpretação e tipologia textual, assim também para ensinar estrutura e elementos textuais. Nesse caso, devem entrar em cena, ainda, as técnicas ou métodos que os leitores usam para adquirir a informação, ou, ainda, procedimentos ou atividades escolhidas para facilitar o processo de compreensão em leitura. São planos flexíveis adaptados às diferentes situações que variam de acordo com o texto a ser lido e a abordagem elaborada, previamente, pelo leitor, para facilitar a  compreensão do texto lido.
Ademais, os estudantes necessitam discutir, em sala de aula, temas atuais e que digam respeito ao cotidiano da vida e dos valores sociais e morais da nossa sociedade. E, nesse aspecto, o professor exerce um papel de grande importância ao propiciar não somente a aprendizagem em leitura, mas, também, ao propor modelos técnicos e procedimentos que proporcionem a compreensão leitora. O processo de ensinar seria uma forma de possibilitar ao estudante desenvolver estruturas conceituais e procedimentais, que ampliem seu desempenho diante da vida, do mundo e, sobretudo, na compreensão da linguagem, na interação com textos e com as pessoas.
Então, olhar a língua como uma realidade essencialmente dinâmica, à imagem e semelhança da sociedade, daqueles que a usam, daqueles que criam e recriam sem parar; dos que veem na língua um conjunto heterogêneo de variedades, cuja igualdade e legitimidade reconhecem; finalmente, ver na língua, pelo domínio de recursos de expressão, a possibilidade de lavar os alunos ao acesso aos bens culturais, à articulação desses bens e desse saber aos interesses de sua classe são atitudes que devem caracterizar o professor de português, são atitudes que o professor de português deve manifestar na prática da sala de aula.
Não é demais relembrar, antes de concluir, que a tarefa do professor de língua materna pode ser facilitada e enriquecida pelo apoio que a linguística moderna lhe oferece. Não se quer dizer com isso que ele deva ser um especialista na área. Deseja-se dizer, simplesmente, que é imprescindível acercar-se dos princípios que os estudos linguísticos vêm fixando nas últimas décadas, que lhe propiciariam refletir sobre inúmeros aspectos aceitos, rotineiramente, mas que, à luz dos novos conhecimentos, deveriam ser redefinidos ou até abandonados.
Espero, verdadeiramente, que os professores e os alunos gostem dos textos, com temáticas variadas, e percebam que ensinar e aprender vai além dos livros didáticos, é um exercício de vida para quem vive numa sociedade tão diversificada como esta do século XXI.
Não preparei, para cada texto, uma lista de tarefas, considerando que esta atividade diz respeito aos interesses dos professores e às necessidades dos estudantes. Ofereço, aqui, ao final do livro, uma folha com sugestões de atividades para os alunos, que poderão aplicar os exercícios no trabalho com cada um dos textos e, assim, compreender, mais claramente, a sua estrutura, elementos coesivos, coesores.
A respeito do conceito de coesão, alguns teóricos dizem que a coesão é condição necessária, mas não suficiente, para que se crie um texto. Na verdade, para que um conjunto de vocábulos, expressões, frases seja considerado um texto, é preciso haver relações de sentido entra essas unidades (coerência) e um encadeamento linear das unidades linguísticas presentes no texto (coesão).
A interpretação de texto permite que as pessoas possam estender o domínio sobre a linguagem escrita e falada e se tornem cada vez mais eficientes dentro das informações a serem transmitidas e compreendidas. Por isso a interpretação favorece a compreensão profissional e acadêmica, ofertando um maior entendimento e assimilação de conteúdo e ideias.
Para finalizar, digo que os temas aqui abordados são interessantes, dizem respeito ao cotidiano de nossas vidas, nossos valores e conceitos sobre o mundo que nos cerca. A interpretação deles permitirá, ao leitor, a compreensão de todo e qualquer texto ou discurso, que se ampliará no entendimento e no olhar de cada leitor sobre as ideias aqui postas. Trata-se de uma competência imprescindível no mercado de trabalho e na vida estudantil.
         Luísa Karlberg
              A autora


PALESTRA PROFERIDA NA FAAO PELA PROF.ª DR.ª LUISA KARLBER - PRESIDENTE DA AAL

EM 30/08/2016 - FAAO






                                                                                                         Palestra NA FAAO em 30/08/2016
Prof.ª Dr.ª Luisa Galvão Lessa Karlberg
Professora DCR/CNPq/FAPAC
Presidente da Academia Acreana de Letras - AAL

1 - O DISCURSO
O termo discurso admite muitos significados. O mais conhecido deles é do discurso como uma exposição metódica sobre certo assunto. Um conjunto de ideias organizadas por meio da linguagem, de forma a influir no raciocínio, ou quando menos, nos sentimentos do ouvinte ou leitor.
Outro significado corrente -- muito usado entre os linguistas, cientistas sociais e estudiosos da Comunicação - como Michel Foucault e Émile Benesviste - porém menos difundido -- é do o discurso como algo que sustenta e ao mesmo tempo é sustentado pela ideologia de um grupo ou instituição social. Ou seja, ele é baseado em um conjunto de pensamentos e visões de mundo derivados da posição social desse grupo ou instituição, que permitem que esse grupo ou instituição se sustente como tal em relação à sociedade, defendendo e legitimando sua ideologia, que é sempre coerente com seus interesses.
O termo discurso é ainda reivindicado por linguistas, psicólogos, antropólogos e sociólogos de diversas orientações teóricas. Assim, ora aparece associado a perspectivas cognitivistas, ora a concepções interacionistas, pragmáticas etc.
1.1 - O discurso segundo Aristóteles
Aristóteles, em seus estudos, tipifica quatro espécies de discurso, segundo sua finalidade, ordenando-os segundo o grau de rigor que o método produz. A concepção de discurso tratada por Aristóteles se liga mais à primeira acepção da palavra, conforme explicado anteriormente.
  • O discurso lógico, que é o método pelo qual se atinge a uma certeza no qual o axioma resultante é tido como verdadeiro e indubitável, pode ser produzido mecânica ou eletronicamente por engenhos e tem indispensável aplicação, principalmente, na matemática.
  • O discurso dialético, que embora não objetive alcançar a certeza absoluta, tenta obter a máxima probabilidade de certeza e veracidade que se verifica da síntese entre duas afirmações antagônicas, a saber a tese e sua antítese.
  • O discurso retórico, onde não há o menor comprometimento na busca da verdade, nem da sua demonstrável probabilidade. Aqui o orador ou escritor objetiva apenas convencer o ouvinte ou leitor de que sua tese é certa ou verdadeira, utilizando-se do modo de falar, dos gestos e até da maneira de se vestir como fatores para influenciá-lo ou persuadi-lo.
  • O discurso poético, quando o grau de certeza ou veracidade nada importa, ou melhor, até pode laborar contra o discurso posto que aí a razão é abandonada em favor da ficção ou da fantasia. Neste método o que se busca é influir na emoção e não no raciocínio do ouvinte ou leitor, como modo de impressioná-lo.
1.2 - Discurso segundo Émile Benveniste
Para o linguista francês Émile Beneviste, o discurso é a expressão da língua como instrumento de comunicação. Ele foi responsável pelo desenvolvimento da Teoria Enunciativa, em que define enunciação como a necessidade de referir pelo discurso. A enunciação é entendida como um processo pelo qual o sujeito do discurso mobiliza a língua por sua própria conta, ela converte a língua em discurso pelo emprego que o locutor faz dela, semantizando-a. Simplificando, a enunciação é a discursivização da língua.
Uma das principais críticas ao conceito benvenistiano de discurso vem de Michel Pêcheux, em sua obra Semântica e discurso, na qual afirma que esse conceito funda-se em distorções individuais, escapando do processo de produção por uma variedade ilimitada própria da fala, tornando-se um avatar dela.
1.3 - Discurso segundo Michel Foucaul
Em A Ordem do Discurso, de 1970, Michel Foucault analisa a formação e manutenção dos discursos baseando-se nos tensionamentos de poder e controle social.
Para o autor, o discurso atravessa todos os elementos da experiência, pois o discurso está em todo conjunto de formas que comunica um conteúdo, qualquer seja a linguagem à qual pertençam. Segundo Foucault, mais importante que o conteúdo dos discursos, é o papel que eles desempenham na ordenação do mundo: um discurso dominante tem o poder de determinar o que é aceito ou não numa sociedade, independentemente da qualidade do que ele legitima. O discurso dominante não está comprometido com uma verdade absoluta e universal. Pelo contrário, é ele que produz a verdade (logo, esta é arbitrária), que legitima um certo campo de enunciados e marginaliza outros - num processo que o autor chama de partilha da verdade.

1.4 – Pessoas do Discurso Científico
Segundo Orlandi (1992, p.20),discorrer acerca das pessoas relativas ao discurso científico significa relembrar algumas noções gramaticais. Pessoas do discurso equivalem às pessoas gramaticais, utilizadas para que a comunicação possa ser materializada.
Dessa forma, didaticamente, temos a primeira pessoa – representada por aquela que fala; a segunda – fazendo referência àquela com quem se fala; e a terceira – aquela de quem se fala. Tais elucidações nos levam a questionar acerca da forma pela qual se deve traçar o perfil de nosso discurso enquanto pesquisadores, ou seja, se se trata de algo que servirá ao conhecimento coletivo, ele deverá primar pela objetividade ou pela subjetividade?
Foquemos, pois, na terceira pessoa (referente àquela de quem se fala). Trata-se das pessoas gramaticais “ele/ela”, as quais tanto podem se referir a uma pessoa propriamente dita, quanto a um objeto. Eis, então, que na pesquisa o “objeto” é normalmente o assunto a ser explorado, a temática que será investigada.

1 5 - A linguagem comum e a linguagem científica
A linguagem científica tem características próprias que a distinguem da linguagem comum. Essas características não foram inventadas em algum momento determinado. Ao contrário, foram sendo estabelecidas ao longo do desenvolvimento científico, como forma de registrar e ampliar o conhecimento. Essas características, muitas vezes, tornam a linguagem científica estranha e difícil para os alunos. Reconhecer essas diferenças implica em admitir que a aprendizagem da ciência é inseparável da aprendizagem da linguagem científica.
Enquanto na linguagem comum predominam narrativas que relatam sequências lineares de eventos, a linguagem científica congela os processos, transformando-os em grupos nominais que são então ligados por verbos que exprimem relações entre esses processos. A linguagem científica é, portanto, predominantemente, estrutural enquanto que a linguagem cotidiana é linear, apresentando uma ordem sequencial que é estabelecida e mantida.
Na linguagem científica, o agente normalmente está ausente, o que faz com que ela seja descontextualizada, sem a perspectiva de um narrador. Na linguagem cotidiana, o narrador está sempre presente.
O discurso científico é essencial para a ciência; romper com as opiniões, com o imediatismo, com a ordem do real e buscar a objetividade e universalidade faz parte da constituição da ciência e sua diferenciação em relação aos demais saberes, ao cotidiano e ao senso comum: “Para se constituir, a ciência tem que romper com as evidências e ‘códigos de leitura’, do real que elas constituem, inventando um novo código, constituindo um novo ‘universo conceitual’, um novo sistema de novos”.
A linguagem científica é uma metalinguagem, constitui-se de códigos de circulação restrita à comunidade científica, dominados apenas por seus membros,através de extenso treinamento – em si, um processo de assujeitamento a uma formação discursiva específica, própria para o exercício da ciência, através de mecanismos de controle dos sentidos permitidos e não permitidos, de verdade e não-verdade.
Os códigos que constituem essa metalinguagem se apresentam ilusoriamente neutros, objetivos, lineares e a-históricos. O cientista se submete à memória do seu saber e se assujeita, se relacionando com essa memória, assimilando o que pode e deve ser dito e o que não pode, ocorrendo aí a inscrição do sentido na história (Orlandi, 1997, p. 30). O discurso científico é, portanto, um discurso próprio a ser interpretado dentro de uma formação discursiva específica.

1.6 - Discurso e dinâmica científica
Segundo Campanario (2004a), apesar da comunicação científica (revisão e publicação em revistas especializadas) desempenhar um papel crucial na dinâmica da ciência, características presentes nos textos científicos, como os inúmeros recursos que autores empregam para convencer os leitores de determinadas interpretações de seus dados e resultados, raramente recebem atenção por parte daqueles que estudam e/ou fazem a ciência. A aprendizagem acerca da mecânica das publicações e de sua importância para um cientista é promovida geralmente de forma implícita ou não planejada durante o percurso de formação de um pesquisador (CAMPANARIO, 1999). Dessa forma, os estudantes de ciências – inclusive no nível universitário – tendem a ler, aceitar e reproduzir passivamente os conteúdos e recursos linguísticos presentes nos textos científicos.
Coracini (2007) também chama a atenção para a atitude passiva dos alunos diante de textos da área: raramente questionam seus conteúdos, conclusões, metodologia, objeto de estudo; não se dão conta do efeito de “camuflagem enunciativa”. Nesse sentido, a autora defende a necessidade de se criar condições para que o aluno não faça uma leitura ingênua do texto científico, isto é, que não se deixe envolver pelas estratégias manipulatórias da linguagem que conferem ao texto a aparência de objetividade e imparcialidade [...]. O simples questionamento das formas linguísticas do texto científico possibilita ao aluno uma melhor compreensão dos processos de produção do sentido e seu posicionamento com relação à sua própria atividade (CORACINI, 2007, p.183-184).
Por outro lado, o discurso científico também revela algumas marcas linguísticas de subjetividade. Conforme Campanario (2004b), os autores não desaparecem como um todo: estão ali, argumentando sutilmente e orientando o leitor para que siga o caminho que conduz às interpretações que desejam transmitir.
Segundo Campanario (2004b) e Coracini (2000) é possível observar a presença do autor no texto científico quando este: (a) eventualmente revela-se através de pronomes pessoais; (b) assume sua pesquisa justificando a escolha do tema ou do material; (c) admite algumas limitações da pesquisa; (d) avalia a ocorrência de um fenômeno ou resultado (manifesta um juízo de valor); (e) faz hipóteses, sugestões; (f) sugere novas pesquisas; ou (g) faz um apelo direto ao leitor usando formas imperativas.

1.7 - Manipulação das citações bibliográficas
Uma análise mais profunda do discurso científico pode rever outros recursos que são habilidosamente acrescentados ao texto, como, por exemplo, as estratégias de “manipulação” das citações bibliográficas apresentadas. Segundo Latour (2000), as principais estratégias dessa natureza são:
a) fortalecimento dos trabalhos similares ao do autor;
b) “ataque” às referências que possam opor-se à tese do autor;
c) fortalecimento de um artigo para enfraquecer um outro que esteja em oposição ao trabalho do autor;
d) oposição de contra-argumentos de tal maneira que um invalida o outro.

1 8 – Qualidades da Redação científica
Principais qualidades da redação científica Correção:
1)       Uso correto do idioma;
2)       Concisão: síntese, brevidade;
3)       Clareza: transparência;
4)       Objetividade: direto, sem considerações pessoais;
5)       Imparcialidade:  Justo, sem motivações pessoais;
6)       Precisão: exatidão, rigor;
7)       Harmonia: ordem, consonância;
8)       Originalidade: singular, único;
9)       Vigor: força Simplicidade: natural, compreensível;
10)   Função informativa: use linguagem positiva.

1.9  - Como melhorar a redação de um texto científico

a)      Eliminar palavras desnecessárias;
b)       Evitar repetições;
c)       Evitar uso de adjetivos e advérbios;
d)      Utilizar palavras curtas (sinônimos)‏;
e)       Evitar expressões longas;
f)        Usar voz ativa;
g)       Usar ordem direta das palavras;
h)       Adotar um padrão, quando citar várias opções;
i)         Evitar o uso de termos pouco comuns.

1.    9 - Padronização rígida da organização textual

Mesmo quando sem uma imposição explícita das normas às quais o texto deve se adequar, o autor geralmente se mantém fiel à padronização que costuma ser seguida pela comunidade científica (CORACINI, 2007). Esse aspecto facilita seu processo de leitura, uma vez que o texto apresenta elementos já conhecidos pelo leitor da área. No texto, essa característica manifesta-se das seguintes maneiras:
a) divisão em seções típicas e em sequência definida;
b) limitações quanto ao tamanho do texto;
c) padronização na forma de apresentação das citações e referências bibliográficas;
d) padronização na forma de apresentação de figuras, tabelas e suas legendas.

1.10 - Pressuposta existência de contra-argumentos

A análise de textos científicos demonstra que o autor tenta prever as objeções do leitor e, dessa forma, antecipa suas respostas (LATOUR, 2000). Sobre esse aspecto, Coracini (2007) ressalta que o autor estabelece sua demonstração em função dos possíveis argumentos contrários apresentados pelo interlocutor. Nesse sentido, inúmeros recursos e informações são acrescentados ao texto para ter seu trabalho aceito por seus pares, diante de todas as possíveis contestações do leitor.

1.    11 - Uso de vários tipos de citações e referências bibliográficas

Embora as citações e referências bibliográficas se constituam em uma exigência da comunidade científica, tal fato não invalida seu uso como recurso retórico, persuasivo. Ao contrário. O autor serve-se de uma convenção para melhor atingir seu objetivo: convencer o leitor da veracidade e importância de sua pesquisa (CORACINI, 2007). Sobre esse aspecto, Latour ressalta que “uma monografia sem referências é como uma criança desacompanhada a caminhar pela noite de uma grande cidade que ela não conhece: isolada, perdida, tudo pode acontecer-lhe” (LATOUR, 2000, p.58).

1.12 - Manipulação das citações bibliográficas

Uma análise mais profunda do discurso científico pode rever outros recursos que são habilidosamente acrescentados ao texto, como, por exemplo, as estratégias de “manipulação” das citações bibliográficas apresentadas. Segundo Latour (2000), as principais estratégias dessa natureza são:
a) fortalecimento dos trabalhos similares ao do autor;
b) “ataque” às referências que possam opor-se à tese do autor;
c) fortalecimento de um artigo para enfraquecer outro que esteja em oposição ao trabalho do autor;
d) oposição de contra-argumentos de tal maneira que um invalida o outro.


REFERÊNCIAS
CAMPANARIO, J.M. Cientificos que cuestionam los paradigmas dominantes: algunas  implicaciones para la enseñanza de las ciencias. Revista Electrónica de Enseñanza de las Ciencias, v.3, n.3, p.257-286, 2004a.
CAMPANARIO, J.M. Algunas posibilidades del artículo de investigación como recurso didáctico orientado a cuestionar ideas inadecuadas sobre la ciencia. Enseñanza de las ciencias, v.22, n.3, p.365-378, 2004b.
CAMPANARIO, J.M. La ciencia que no enseñamos. Enseñanza de las ciencias, v.17, n.3, p.397-410, 1999.
CORACINI, M.J. Um fazer persuasivo: o discurso subjetivo da ciência. Campinas: Pontes Editores, 2007.
ORLANDI, E. P. Discurso e Leitura. 1988. São Paulo, Cortez.
ORLANDI, E. P. As Formas do Silêncio: no Movimento dos Sentidos. 1992.Campinas/SP, Editora da Unicamp.
ORLANDI, E. P. 1997. Leitura e Discurso Científico. Cadernos Cedes. Campinas, ano XVII, nº 41, pp. 25-35.
POSSENTI, S. 1997. Notas sobre Linguagem Científica e Linguagem Comum. Cadernos Cedes. Campinas, ano XVII, nº 41, pp 09-24.  
FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. São Paulo, Loyola, 1996
PÊCHEUX. Michel. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. Campinas, Editora da UNICAMP, 1995.
LATOUR, B. Ciência em ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade afora. São Paulo: Editora UNESP, 2000.
SANTOS, B. S. S. Introdução a uma Ciência Pós-Moderna. 1989. Rio de Janeiro, Edições Graal.